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SAPO24 Crónicas

Todos os dias um olhar mais atento a um tema que marca a actualidade. Artigos, análises e crónicas exclusivas no SAPO24.

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Bancos suiços têm contas no valor de 40 milhões de euros para os herdeiros reclamarem

A associação dos banqueiros suiços publicou esta quarta-feira na internet uma lista de contas bancárias inativas, para permitir que os eventuais herdeiros as reivindiquem.

 Foto: Rijksdienst voor het Cultureel Erfgoed, licença CC BY-SA 3.0

 

São contas de pessoas físicas ou entidades que não têm nenhum movimento há 60 anos, ou seja, desde 1955, diz o comunicado da ASB.

A lista inclui pouco mais de 2.600 nomes, que representam um total de bens próximo a 44 milhões de francos suíços (40 milhões de euros). A isto se soma o conteúdo de 80 compartimentos de caixas fortes.

A lista será atualizada a cada ano, em virtude de uma nova lei sobre as contas inativas. Os eventuais herdeiros terão entre um e cinco anos para reivindicá-las.

A nova lei também prevê a transferência para o governo dos bens de que não se tem notícia há pelo menos 60 anos.

No passado, a Suíça já tinha publicado listas de contas em desuso, mas estas tinham um vínculo direto com as vítimas do Holocausto.

 

 

Fonte: AFP

publicado às 14:00

Quando não há dinheiro...

Por: António Costa

 

Se as contas públicas portuguesas ainda estão longe de estarem resolvidas, apesar do défice abaixo dos 3% e de uma dívida pública a iniciar uma descida a passo de caracol, é no sistema financeiro, na sua capitalização, que está o principal problema do país, e é esse que tem de ser prioritário na agenda de Mário Centeno. O Banif entra na semana de todas as decisões, e o Plano B é, outra vez, uma intervenção pública, sobretudo a pensar nos outros bancos.

 

Quando a troika entrou em Portugal, a ajuda externa compreendia uma linha de 12 mil milhões de euros de capitalização para reforçar os rácios de capital dos bancos, na prática as almofadas financeiras contra a crise. Mas, ao contrário do que sucedeu em Espanha, por exemplo, aqui, a banca, e o Banco de Portugal e o Governo, preferiram disfarçar, pôr debaixo do tapete, gerir os problemas em vez de resolve-los de uma vez. Pequenas injeções de capital, no limite do estritamento necessário. Deu asneira.

 

Cada caso foi, e é, um caso, com as suas próprias explicações, e algumas não são bonitas. Mas há, comum a todas, uma política de concessão de crédito pouco exigente, sem avaliação de risco, muitas vezes aos amigos, que resultou em perdas e em intervenções, com recurso ao dinheiro dos contribuintes. Mas como não há economia sem bancos, em emergência, não houve alternativa. Os contribuintes pagaram naqueles momentos para não pagarem, ainda mais, mais tarde.

 

Ainda assim, já passou o tempo suficiente para que as autoridades, desde logo a de supervisão, mas também as políticas, tenham aprendido. Até porque as regras europeias estão a mudar, e vão mudar ainda mais, ao ponto de obrigarem a intervenções de ‘bailin’ e não de ‘bailout’, isto é, com dinheiro dos acionitas, obrigacionistas e depositantes, em vez do dinheiro dos contribuintes. Não só é justo como é moralmente necessário, impõe mais exigência de quem compra ações, mas também aos que aplicam as suas poupanças, sobre a gestão dos bancos. Mas, enquanto não muda...

 

O Novo Banco corre a sua pista própria, cheia de pedregulhos, mas agora com tempo para reescrever a sua história, leia-se a ‘descoberta’ de um investidor que compre o banco. O Banif é um banco de menor dimensão, sobretudo com presença nas regiões autónomas, mas, por ser ‘mais um’, tem as características para se transformar num grande problema, sobretudo para o próprio sistema financeiro como um todo. Como? Pela desconfiança de investidores e depositantes.

 

Um banco tem, permanentemente, três áreas de risco: balanço, rácios e liquidez. Ironicamente, os rácios e a liquidez do Banif estão, agora, salvaguardados, mas o balanço é frágil, tem muito crédito mal parado de imobiliário e não consegue devolver ao Estado 125 milhões de euros do que recebeu a título de empréstimo. Ora, é esta incapacidade, e as exigências do BCE e da Direção-Geral da Concorrência (DGComp) para que tal seja feito até ao final do ano, que estão a pôr uma pressão brutal sobre o banco, sobre a sua cotação em bolsa, no limite, sobre a sua liquidez. E não conheço nenhum banco que tenha resistido à desconfiança dos depositantes.

 

O Banif não está em risco de fechar, mas tem de encontrar um investidor que compre os 60% de capital que estão hoje nas mão do Estado. Até ao final desta semana, coisa no mínimo difícil, apesar do trabalho de casa já feito. A alternativa é uma resolução à moda do BES/Novo Banco. O Estado transformará os ditos 125 milhões em capital, ficará na prática com a totalidade do Banif e, depois, vai separar o trigo do joio, o banco bom do banco mau. O banco bom poderá continuar a ser um banco independente, vendido a terceiros ou, no limite, integrado na CGD. O PS gostaria de seguir esta última solução – a história mostra-nos que os socialistas usam a Caixa para isto e muito mais -, mas a Europa não está pelos ajustes. Porque a CGD também tem os seus problemas e não sabe como resolvê-los.

 

O presidente do Banif, Jorge Tomé, não tem uma tarefa fácil, aliás, não tem desde o primeiro dia em que entrou em funções. Já estará arrependido de ter entrado. Está há dois anos a negociar com a Concorrência europeia o processo de reestruturação que tem de ser aprovado depois do Estado aumentar o capital e emprestar.

 

Os contribuintes, é bom recordá-lo, já pagaram a fatura do Banif, quando o Estado passou a acionista e essa injeção de 700 milhões de euros foi à despesa pública. Agora, Tomé chegou a um beco com duas saídas: encontra um comprador para os 60% do Estado ou entrega as chaves a Mário Centeno. Em qualquer dos casos, o sistema financeiro como um todo tem de ser protegido.

 

 

As escolhas

 

Marine Le Pen perdeu, mas ganhou. Perdeu a possibilidade de mandar em alguma das regiões de França, mas ganhou muitos votos em relação à primeira volta das eleições regionais, por isso, no meio dos suspiros de alívio que se ouviram ontem em Paris, a voz mais certeira foi a do primeiro-ministro Valls. A derrota da Frente Nacional de Le Pen resultou de uma concertação de adversários, de Hollande e Sarkosy, uma aliança positiva para impedir a extrema-direita. Mas a procissão política ainda vai no adro, e as eleições presidenciais estão ao virar da esquina.

publicado às 10:24

Não é apenas uma questão de fazer contas

Por: António Costa

 

Portugal precisa de sair do procedimento dos défices excessivos em 2015, isto é, precisa de ter um défice público igual ou inferior a 3%. E é isso que vai suceder se António Costa e Mário Centeno puserem Portugal à frente dos interesses políticos do Governo e de um confronto partidário com os partidos da Direita.

 

O país parece ter descoberto a pólvora com as informações da Unidade Técnica Orçamental (UTAO) de apoio ao Parlamento sobre as contas públicas de 2015. Não terão lido os últimos relatórios da UTAO, talvez. É bom recordar, por causa de três décimas no défice, não são três pontos percentuais como se veio a verificar em 2009, três décimas, o que separa o objetivo de 2,7% fixado pelo anterior governo e o que está agora em cima da mesa, os 3%, admitidos como possível pela mesma instituição independente. Há uma certa excitação política no ar, e uma confusão deliberada entre as almofadas orçamentais de cada ano e os, infeliz expressão, cofres cheios. Há de tudo para o combate político. Desde que isso não prejudique o país.

 

Vamos por partes. Felizmente, hoje, temos informação suficiente, e em tempo útil, sobre as contas do país. E independente. Se regressarmos às eleições de 2009 ganhas por José Sócrates, foi anunciado então um défice abaixo dos 6% e, na verdade, o ano acabou com um desequilíbrio orçamental superior a 9%. Tarde demais, como se percebeu em 2011.

 

Dito isto, a derrapagem do objetivo de défice de 2,7% para 3% e o recurso às almofadas orçamentais, é preciso dizê-lo, resultam das concessões eleitorais de última hora feitas por Passos Coelho, Paulo Portas e Maria Luís Albuquerque. A grupos de interesse públicos, especialmente nas áreas da educação e justiça. Era preciso comprar votos, comprar a paz social a meses das eleições.

 

Apesar disso, a utilização total da dotação provisional e da reserva orçamental não é nova. António Costa e Mário Centeno têm ainda mais de 100 milhões de euros para o último mês, o que não é assim tão pouco. Mas será preciso, provavelmente, fazer mais qualquer coisa.

 

A garantia dos cofres cheios, já agora, é outra história. Em 2011, Portugal não tinha reservas para se aguentar mais do que um ou dois meses, tinha os cofres quase vazios. Agora, há dinheiro – dívida – para cerca de um ano de responsabilidades, caso se verifique o pior. E o pior seria o agravamento dos juros da dívida pública, por razões internas ou externas. Por exemplo, se a agência canadiana de rating deixasse de considerar Portugal numa situação de ‘investment grade’.

 

Mário Centeno vai hoje a Bruxelas para explicitar os primeiros números do que será o Orçamento de 2016. E tem ainda 20 dias de execução deste ano, por isso, se é assim tão difícil segurar o défice deste ano nos 3%, deveria provavelmente emitir um despacho a impor limites à autorização de despesa, no Estado central, e sobretudo nas autarquias. É uma decisão nas mãos do novo ministro que, por razões de segurança, até já deveria estar tomada. Como foi tradição dos seus antecessores.

 

De resto, se o défice for mesmo fixado em 3%, idêntico ao que a Comissão Europeia estima para este ano, o programa de governo não beneficiará apenas da saída do procedimento dos défices imposto por Bruxelas e com a respetiva vigilância reforçada. É também o ponto de partida das contas de Centeno para as medidas próprias e negociadas com o BE e PCP. E em Maio, quando Bruxelas avaliar mesmo o dito procedimento, só poderá decidir pela exclusão de Portugal... se a estratégia de Costa e Centeno bater certo.

 

Portanto, não é apenas uma questão de fazer contas. Já agora, esta manhã, temos a oportunidade de ler a primeira entrevista de Costa ao Público. Sobre política, e sobre economia. A não perder, e a fazer contas.

 

As escolhas

 

A França acordou outra vez em choque, desta vez político, mas diretamente relacionado com os ataques terroristas em Paris. Marie Le-Pen ganhou a primeira volta das eleições regionais em França e corre o ‘risco’ de vir a governar em duas regiões... com cerca de 11 milhões de pessoas.

 

E por falar em eleições, estará alguma coisa a mudar na Venezuela. Os resultados das eleições dizem que sim, a oposição já ganhou a maioria dos assentos parlamentares a Nicolas Maduro. Será desta que salvam o país do populismo?

publicado às 10:32

Sondagens: fazer as perguntas certas

Por: Pedro Magalhães

 

 Ao longo dos últimos quatro anos, teria sido importante saber o que pensam os portugueses sobre temas como a Troika, o emprego, as exportações ou a pobreza. Não é que faltem opiniões por aí. Somos continuamente bombardeados com elas, dadas por políticos, comentadores, analistas, especialistas e cidadãos mais ou menos anónimos, através dos jornais, da televisão, da rádio e das redes sociais. Mas, quase por definição, estas opiniões pessoais são uma má base a partir da qual inferir o que pensam os cidadãos em geral. Se as sondagens cumprem funções úteis numa democracia – uma questão controversa, bem sei – a mais útil de todas será precisamente a de nos ajudar a conhecer as preferências e opiniões daqueles que não conseguem fazer ouvir a sua voz por outros meios.

 

O que sabiam os portugueses sobre as principais medidas do chamado “Memorando de Entendimento” com a Troika, que condicionou as principais opções governativas durante grande parte da legislatura que agora termina? O que pensavam sobre essas medidas, e como evoluiu essa opinião? Como mudou, mês a mês, ao longo dos últimos quatro anos, a sua percepção sobre o estado da economia? O que sabiam os portugueses sobre os dados do crescimento económico, da evolução do desemprego, das exportações, da desigualdade ou da pobreza? De onde e como lhes chegou essa informação? Que importância lhe deram? Que responsabilidades foram atribuindo ao governo presente, a governos anteriores ou a outros actores? O que se pensava em Portugal sobre as principais medidas orçamentais que foram escrutinadas pelo Tribunal Constitucional? Que opiniões tiveram os eleitores, nos últimos quatro anos, sobre a actuação do governo nos domínios da saúde, da educação, da política económica, da justiça, da política externa ou da ciência? E sobre as alternativas apresentadas pelos partidos da oposição? Que sabem sobre a situação da segurança social e sobre possíveis opções para a sua reforma? Que partidos julgam melhor representar as suas preferências e valores? E mais importante: como é que tudo isto foi variando por idade, instrução, rendimento, orientação ideológica ou simpatia partidária, por exemplo?

 

Ao longo dos últimos quatro anos, teria sido importante saber as respostas a estas e muitas outras questões semelhantes. A aproximação das eleições torna-as ainda mais importantes. Quando chegarmos a 4 de Outubro, será muito difícil explicar os resultados eleitorais sem saber a resposta a muitas delas. Vaticino que a maioria dirá que os resultados eram afinal previsíveis, procedendo de seguida à explicação segura e conhecedora dessa completa previsibilidade. Mas essas explicações seriam mais sólidas se tivéssemos tido, ao longo destes quatro anos, a possibilidade de acompanhar a opinião pública portuguesa de forma mais profunda e sistemática do que realmente tivemos.

 

Não foi por causa de uma qualquer impossibilidade técnica ou metodológica que ficámos privados dessa informação. Quem quiser saber como os americanos vêm avaliando de forma diferenciada a actuação do Presidente Obama nos domínios da saúde, da economia, ou da política externa, por exemplo, poderá clicar nos links anteriores. Poderá aí saber a posição dos americanos sobre alguns dos principais temas políticos do dia, tais como o controlo da venda de armas, a imigração, as relações raciais ou a desigualdade de rendimentos. Terá uma visão não apenas do que pensa a população em geral, mas também de como todos estes assuntos a dividem, ao longo do tempo, por grupos definidos pela idade, o rendimento, a educação, o local onde vivem, a etnia, a ideologia e a simpatia partidária. Poderá apreciar a distância entre os dados da economia “objectiva” e a maneira como é apercebida pelos cidadãos e vivida pelas famílias. Poderá saber onde os indivíduos recolhem a informação que usam para avaliar os políticos, como escolhem essas fontes e como elas, por sua vez, reforçam ou modificam as suas predisposições. Obviamente, em todos estes e muitos outros possíveis exemplos, colocam-se dúvidas metodológicas, sobre diferentes maneiras de medir estas atitudes e comportamentos, a maneira de formular as questões ou a amostragem e seus critérios. Mas o ponto é que esta informação está disponível e resulta de “sondagens”.

 

E em Portugal? Aqui, à parte os inquéritos académicos ou o Eurobarómetro, sem dúvida relevantes mas realizados muito espaçadamente, as sondagens encomendadas e divulgadas pelos meios de comunicação social sofrem de uma quase permanente monomania em torno de intenções de voto e popularidade de líderes político-partidários. É certo que há, ocasionalmente, excepções. Como aqui ou aqui, onde se colocaram questões sobre grandes opções de política fiscal. Ou aqui, aferindo-se desejáveis prioridades de actuação de um novo governo e decompondo as respostas por grupos de inquiridos. Contudo, este esforço é episódico, impedindo a detecção de mudanças ou continuidades ao longo do tempo. Está frequentemente colado, na maneira como as questões são colocadas, a notícias concretas e irrepetíveis (“A Ministra das Finanças afirma que temos os cofres cheios, concorda?”), não apontando para a detecção de preferências e atitudes relevantes ou estáveis. As variáveis que permitiriam desagregar as respostas por grupos, definidos por características sócio-demográficas ou políticas, estão muitas vezes ausentes dos questionários. E mesmo quando existem, essa decomposição é, na maior parte das vezes, ignorada pelos próprios órgãos de comunicação social que encomendaram a sondagem, seja porque preferem retratar um agregado cuja “opinião” é na verdade inexistente (“os portugueses”) ou porque não têm jornalistas capazes de decifrar as implicações desse tipo de análise. E em geral, as potencialidades do online no arquivamento e visualização do histórico destes resultados e da sua análise mais fina, exemplificadas aqui ou aqui, são quase completamente ignoradas.

 

Porquê? A resposta mais fácil e óbvia, e não por isso menos verdadeira, tem a ver com recursos. Mercados pequenos e órgãos de comunicação social em crise geram, inevitavelmente, sondagens baratas e concentradas na supostamente fundamental “corrida de cavalos”. Serão, logo, muito menos completas e interessantes – para já não dizer menos metodologicamente robustas – do que aquelas que os responsáveis técnicos dos centros poderiam fazer com outras condições. Redacções emagrecidas, com jornalistas assoberbados de trabalho e incapazes de se especializarem, resultam num tratamento superficial dos resultados, numa baixíssima utilização das possibilidades fabulosas que hoje existem de tratamento e apresentação dos dados e numa reduzida exigência em relação às empresas. Por outro lado, não temos um equivalente ao Centro de Investigaciones Sociológicas espanhol nem ao Pew Center americano, alternativas, respectivamente, estatal e non-profit aos media privados na encomenda de estudos de opinião. E poderíamos continuar por aqui.

 

Contudo, suspeito que os problemas de recursos se foram transformando num problema mais geral de mentalidade, que torna as coisas piores do que teriam de ser. As sondagens e os seus resultados são, na comunicação social portuguesa, quase exclusivamente tratados como meros geradores de itens noticiosos entre muitos outros. Essas “notícias” são por vezes inexistentes do ponto de vista factual (“subiu 0,3%”), mas isso não impede que criem “eventos políticos” que podem ser “analisados” nos painéis nocturnos dos canais de notícias 24 horas, para serem depois esquecidos passados dois ou três dias. Alimentados nesta dieta noticiosa em que as sondagens são utilizadas meramente como parte de uma horse race coverage, somos todos condicionados a colocar sempre o mesmo tipo de perguntas sobre as sondagens. Porque estão uns partidos ou candidatos à frente numas e outros noutras? A quem beneficiam estes resultados? Se beneficiam, foram manipuladas para esse fim? Acertaram? Se não “acertaram”, quem as manipulou para não acertarem? E por aí fora. Nem todas estas dúvidas são idiotas. Algumas são relevantes, apesar de serem colocadas quase sempre com intuitos políticos mais ou menos evidentes. E são todas filhas deste ambiente geral e, por isso mesmo, perfeitamente compreensíveis.

 

Contudo, devíamos também ser capazes de colocar outra pergunta. Apesar dos poucos recursos, terão mesmo de ser tão superficiais e desinteressantes as sondagens que se fazem em Portugal e, logo, tão superficial e desinteressante a cobertura que geram? Lidar com este problema é do interesse de todos. Se as sondagens servirem apenas para analisar a “corrida de cavalos”, o discurso estritamente politizado sobre elas acabará, mais tarde ou mais cedo, por se tornar absolutamente hegemónico: está demasiado em jogo. Mas se isso acontecer, aqueles que fazem as sondagens e aqueles que as analisam acabarão por ser vistos como parte desse jogo e, logo, descredibilizados como fontes de informação relevante.

 

É isto que importaria impedir. A “corrida de cavalos” fará sempre parte do interesse e do “picante” das sondagens, não tenhamos ilusões. Mas nas sondagens que já se fazem em Portugal, há muitos outros dados e factos sobre o eleitorado e a opinião pública que não são suficientemente valorizados por quem as encomenda e, assim, permanecem ocultos para todos. Não sendo susceptíveis de serem usados para ganho político imediato, são apesar disso muito relevantes. E como espero ter mostrado com os exemplos anteriores, há muitas coisas que não são perguntadas e analisadas que o poderiam ser, sem grandes custos acrescidos. Bastaria um pouco de imaginação, atenção e saber. Teríamos assim uma visão mais profunda do que pensam e querem os eleitores portugueses, daquilo que os une e os divide, e porquê. E uma visão mais profunda do que são as sondagens e para que servem. Se as sondagens podem fazer qualquer coisa de positivo pela democracia, será mais por aqui do que pela obsessão exclusiva com as intenções de voto ou com os termómetros de popularidade.

 

Pedro Magalhães é investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e Director Científico da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Faz investigação da área do comportamento eleitoral e da opinião pública, e foi director do Centro de Sondagens e Estudos de Opinião da Universidade Católica até 2009. Autor do livro Sondagens, Eleições e Opinião Pública.

publicado às 10:35

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