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SAPO24 Crónicas

Todos os dias um olhar mais atento a um tema que marca a actualidade. Artigos, análises e crónicas exclusivas no SAPO24.

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Todos os dias um olhar mais atento a um tema que marca a actualidade. Artigos, análises e crónicas exclusivas no SAPO24.

O fim

Por: Pedro Rolo Duarte

 

A semana não tem sido apenas de chuva - tem sido mais escura que cinzenta, mais triste do que a palavra Primavera anunciava. Parece que a jornalista Tereza Coelho tinha razão: quando mais se bate no fundo, mais ele desce.

 

Ponho ao mesmo nível os escândalos Volkswagen, BES, WikiLeaks, e agora o Panama Papers. Todos nascem do mesmo defeito de fabrico humano: a ambição desmedida. E todos resultam de um mesmo raciocínio: é só um bocadinho, sou só eu, ninguém vai dar por nada.

 

Quando se revelam, quando se abatem sobre o comum dos mortais, os casos têm um de dois efeitos: ou nos deixam a pensar que somos totós por não fazermos o mesmo; ou nos deixam de rastos por chegarmos a esta fase do desenvolvimento humano e vermos que, afinal, boa parte dos que nos rodeiam são selvagens e aldrabões sem principio nem fim.

 

Faço parte do segundo grupo, e dou comigo na absurda situação de estar a ver as notícias sobre o Panama Papers ao mesmo tempo que a operadora que me serve ameaça cortar o serviço porque me atrasei no pagamento de uns escassos euros. É a velha máxima dos bancários: quando deves cem euros ao banco, o problema é teu; quando deves um milhão, o problema é do banco. Acrescento: se não quiseres dever, aldraba, corrompe, foge, mente, e no fim, sorri.

 

Batemos no fundo da ética, da seriedade, e do crédito nos políticos, nos gestores, até mesmo nalguns dos heróis que elegemos no mundo do desporto ou da cultura. Parece que se desmorona a ideia de honestidade associada àqueles que admiramos, ou pelo menos respeitamos. Deixámos de estar apenas no domínio do financiamento partidário, ou das empresas sem escrúpulos, para descermos ao rés-do-chão da existência: ter muito e querer ter mais, a qualquer preço, sem olhar a meios; enganar o Estado e com a mesma desfaçatez enganar clientes, sócios, no limite famílias; viver como se não houvesse regras, leis, como se fosse válida a frase “sem rei nem roque”.

 

Sinceramente, não tenho grande interesse em saber como vai acabar tudo isto, se haverá processos e prisões, responsáveis e casos exemplares - porque o desânimo e o descrédito são mais fortes e mais pesados, derrotam princípios e deixam-nos com poucos argumentos para educar bem os nossos filhos.

 

Achamos que o terrorismo é condenável e julgamo-nos superiores porque dialogamos e vivemos em (suposta) democracia. Na verdade, a corrupção e os negócios sujos do mundo do dinheiro constituem a nossa forma de exercer terrorismo. São minas em terreno que dizemos limpo. Arrasam países como bombas. E também matam - quando o desespero de um desempregado chega ao suicídio, ou quando o dinheiro não chega para a renda e “em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão”.

 

Cada cêntimo opaco que esteja nos milhões de documentos do Panama Papers foi roubado a um de nós. Ter esta consciência é essencial para entender a gravidade do caso - e para perceber onde chegámos. Chegámos ao fim da linha. Já não há fundo onde bater para que ele desça ainda mais.

 

Esta semana não passo sem:

 

Sobre o mega-caso “Panama papers”, todos os jornais, e não apenas o Expresso, que integra a equipa da investigação, têm tentado traduzir em miúdos o que parece, e é, de uma complexidade que escapa à maioria. Mas nada como ir à fonte e visitar o site do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação. Não é tempo perdido…

 

Estreia hoje entre nós “Verdade”, a obra de estreia na realização do argumentista James Vanderbilt - um filme sobre jornalismo, sobre a investigação no jornalismo, sobre a verdade e a mentira, que parece feito à medida para a semana que estamos a viver. Com a garantia das prestações de Cate Blanchett, Robert Redford e Dennis Quaid, o filme tem por base o livro "Truth and Duty: The Press, the President and the Privilege of Power", de Mary Mapes, a produtora envolvida no caso que ficou conhecido como “Rathergate” (foi protagonizado pelo jornalista Dan Rather, da CBS), conta a história deste escândalo à volta de uma investigação sobre George W. Bush ocorrida em 2004.

 

Os 40 anos da Constituição da Republica Portuguesa foram assinalados por todos os media nacionais - mas esta reportagem do “Público” leva, para mim, a taça das taças… 

publicado às 09:23

Onde estão os árabes do petróleo na lista dos mais ricos do mundo?

Por: Márcio Alves Candoso

 

Quando se analisa a lista dos mais ricos, publicada anualmente pela revista norte-americana 'Forbes', fica-se com um amargo de boca. Ou uma dúvida, pronto. É que descobrir aqueles alegados 'cresos' do petróleo do deserto é como achar agulha em palheiro. Será que os hidrocarbonetos das arábias já não dão para o harém e tabaco, ou há ali qualquer coisa que não bate bem?

A primeira resposta vem logo no regulamento da 'Forbes'. Ditadores, cleptocratas e realezas são exluídos desta lista. Está certo que a revista avisa que muitos dos que são analisados, pela sua equipa de mais de 50 investigadores e jornalistas de todo o mundo, por vezes escondem o que têm, e não é fácil fazê-los sair da toca – ou do off-shore, melhor dito. Mas mesmo assim chega-se lá perto, com muito zelo e trabalho, e usando as regras das democracias regulamentadas.

 

É por isso que os árabes do petróleo não aparecem, ou aparecem muito pouco. É preciso consultar outras publicações sem os mesmos pruridos para ter uma ideia – embora fique a percepção de que, ainda assim, longe da verdade dos factos – de como é que aquela gente passou das tâmaras e das cabras para os carros de ouro e diamantes, os palácios de tipologia T-164 e os aviões que fazem inveja ao chefe dos 'yankees'.

 

Voltando à 'Forbes', o primeiro árabe que aparece listado é o príncipe Alwaleed ben Talal Alsaud, que ocupa a 41ª posição do 'ranking', com uma fortuna calculada de 18,5 mil milhões de dólares (*). É dono da cadeia de hotéis 'Four Seasons', tem uma fatia maioritária no Twitter e no Citigroup, e possui investimentos em dezenas de empresas, que concentra na sociedade de participações sociais que dá pelo nome de 'Kingdom Holding, Co.' Kingdom.... está bem.

 

Para encontrar petróleo nas arábias da 'Forbes' é preciso descer até à posição 138, onde encontramos Mohamed Al Amoudi, que empochou até à data 8,3 mil milhões de dólares. Filho de mãe etíope e de pai saudita, este senhor tem qualquer coisa de ouro negro, mas onde ganha razoavelmente bem a vida é na construção e a vender café ao 'Starbucks' e chá à estimada casa 'Lipton'.

 

Em 270º aparece Majid Al Futtaim, dos Emiratos Árabes Unidos, que amealhou os seus escrutinados 5 mil milhões de dólares a vender casas e inaugurando cadeias de retalho comercial. É parente de Abdul Al Futtaim, que vende automóveis e detém os 'franchises' do IKEA, Toys 'R' Us e Marks & Spencer nos emiratos. Tem uma fortuna uma nadita menor. Petróleo, nem vê-lo!

 

As actividades dos mais ricos entre os 'alibabás' mais reconhecíveis e acessíveis pelos critérios da 'Forbes' são diversificadas. Na posição 477 da famosa lista, 100 milhões de dólares abaixo no 'nosso' mais abastado – o empresário Américo Amorim – lá está Mohamed bem Saud Al Kabbeer, que fez fortuna com vacas e ovelhas leiteiras.

 

E chega. Não há mais. Consultando, no entando, o site 'business.com', da revista 'Business Weekly', encontram-se mais alguns árabes. Bader Al Kharafi, do Koweit, juntou 8,5 mil milhões de dólares, e está de vento em popa no negócio das energias renováveis. Issan Al Zahid tem 11,6 mil milhões basicamente ganhos com a construção e obras públicas. Quer encontrar pessoas que enriqueceram à custa do petróleo? Vá à Rússia. É o que há, consultando a 'Forbes' e quejandas...

 

A lista dá-nos ainda outras dicas interessantes. Os três catraios mais ricos do mundo são todos noruegueses. E porquê? Porque os pais lhes passaram para as mãos, mal fizeram 18 anos, uma boa parte da fortuna. A mais nova é Alexandra Andresen, cujo conto de fadas inclui ser titular de 42% da forttuna de família, iniciada há mais de cem anos. Tem 19 anos, e a sua irmã mais velha Katherine tem outro tanto – 1,2 mil milhões cada. Entretanto, Alexandra dedica-se essencialmente a ser campeã junior de 'dressage' lá nos fiordes.

 

O restante é Gustav Magnar Witzoe, um rapaz de 22 anos que detém 47% da empresa dos pais, que é campeã do mundo de aquacultura – 'fish farming' no original. Arrecadou por essa via, até à data, 1,1 'bi'. Mas é empreendedor. Com o 'paitrocínio' já se dedica a investimentos imobiliários e iniciou um negócio de tecnologias. Tal como as suas compatriotas, é solteiro...

 

Casada é Tatiana Santo Domingo, a herdeira – juntamente com os irmãos – da fortuna das cervejas 'Bavaria'. Aos 32 anos, a nova princesa do Mónaco – desposou Pierre Casiraghi, filho de Carolina Kelly Grimaldi – tem de dote 2,4 mil milhões de dólares. O herdeiro da WalMart, Lukas Walton, está também entre os jovens ricaços, bem como o mais conhecido Mark Zuckerberg, o inventor do Facebook. Diga-se que, ontem, o dia correu-lhe mal, já que perdeu em bolsa 425 milhões de dólares. Mas isso não abalou muito a sua fortuna de 44,6 mil milhões, que faz dele, aos 31 anos, o 6º mais rico do mundo!

 

Aliás, nos lugares de topo da lista, abundam os jovens, ou menos jovens, que fizeram fortuna nas novas tecnologias e nas indústrias da informação. Se Bill Gates, o principal accionista e pioneiro da Microsoft, continua a liderar a lista – 16 vezes campeão nos mais recentes 21 anos -, Jeff Bezos, da Amazon, vai em 5º no pelotão, enquanto o dono da Oracle, Larry Ellison ocupa o 7º posto, Larry Page e Sergey Bin (Google) estão respectivamente em 12º e 13º lugares, Michael Dell – empresa com o seu apelido – segue em 35º e a viúva de Steve Jobs, apesar das muitas obras de caridade, ainda tem 16,7 mil milhões, ocupando a 44ª posição; e até subiu no ano passado.

 

Quem está a ficar mais rico são as mulheres. Na lista agora divulgada, assistiu-se a um recorde de 197 de senhoras e meninas nomeadas. E se bem que as heranças familiares ou por viuvez continuem a ser as formas mais típicas de as mulhres enriquecerem, já se vão vendo 'self-made women'. As duas mais ricas, neste quadro, são chinesas, e a liderança pertence a Zou Qunfei, que já ganhou 5,7 mil milhões no imobiliário e etc. Um pouco atrás vai Chan Laiwa, que fez uma fortuna semelhante.

 

Para encontrar uma europeia que subiu às suas próprias custas temos de recuar até à posição 403 do 'ranking', onde está Denise Coates (48 anos, 3,8 'bi'), que ganhou a vida nas apostas 'on-line', através da sua empresa 'Bet365.com'. Ainda estudante, costumava processar dados na loja do pai, que também já se dedicava ao mesmo comércio. Entre apostas, ainda teve tempo para cinco filhos.

 

A mulher mais jovem a ter feito fortuna sem pai ou marido atrás é Elisabeth Holmes, que aos 32 anos tem 3,6 mil milhões, ocupando o lugar 435 da lista 'Forbes'. Inventou umas fantásticas análises ao sangue, que têm estado sob investigação da FDA norte-americana. Mas até à data, não se passa nada.

 

Para o ano há mais. O mundo, entretanto, pula e avança, e eles sabem que o sonho é uma constante da vida. Em 2015, foi batido o recorde do número de 'bilionários' da 'Forbes', ou seja, de pessoas que 'valem' um mínimo de 1000 milhões de dólares. São 1826, e ainda faltam, como se notou mais acima, tudo quanto é ditador, ladrão e rei. No capítulo das novas entradas, os chineses são campeões, com 71 novos ricaços.

 

No total, a lista atinge a soma investigada, conhecida e provada de 7,05 biliões de dólares ('trilions', segundo a gramática anglo-saxónica), mais 600 mil milhões que no ano anterior; ou seja, cerca de 3,5 vezes o PIB português num só ano. E andamos nós preocupados com crescimentos anémicos da nossa economia...

 

(*) o dólar dos Estados Unidos valia, no fecho de ontem, 0,909 euros.

publicado às 09:19

Nunca mais é muito pouco tempo

Por: Rute Sousa Vasco

 

 Já se choraram todas as lágrimas de crocodilo, já se fizeram as declarações mais pias de intenções, já se jurou sobre o que há de mais sagrado – o dinheiro, pois claro. Depois das perdas astronómicas que a crise financeira de 2008 arremessou à economia real – a das empresas, das famílias, das pessoas que não fazem parte desse Olimpo dos triliões – eis que, sem grande espanto nem alarido, regressamos à terra do nunca mais.

 

Factos: A concessão de crédito ao consumo está novamente a disparar em Portugal. Só em Julho, os bancos emprestaram 276 milhões de euros para efeitos de consumo, o valor mais alto desde Março de 2011, em níveis pré-troika.”Somando a concessão de crédito feita pelas financeiras e também os montantes disponibilizados através de cartões, descobertos autorizados e linhas de crédito, então este valor sobe para os 436 milhões de euros em Julho, ou 2,8 mil milhões de euros nos primeiros sete meses do ano, mais 22% face ao homólogo”, escreve o Económico.

 

Certamente que alguns verão nisto uma notícia sinalizadora da confiança. Os banco voltaram a emprestar dinheiro para gastos quotidianos – pode ser um carro, pode ser uma viagem, mas também pode ser simplesmente dinheiro para pagar outras dívidas em atraso. Da mesma forma que os bancos voltaram a emprestar dinheiro para comprar casa.

 

Factos: Os bancos tinham, no final de Julho, quase 5,4 mil milhões de euros em crédito de cobrança duvidosa das famílias, segundo dados do Banco de Portugal. É no crédito à habitação que o montante de malparado é mais elevado. No crédito ao consumo, o montante dado como de difícil recuperação é superior a 1,3 mil milhões de euros.

 

O tema que vale a pena discutir é que para as pessoas reais e empresas reais muito pouco mudou para não dizer que tudo está na mesma. Dir-se-á que é da natureza conservadora da banca não ter golpes de asa para investir em coisas novas ou de forma diferente. Dir-se-á que as manobras financeiras dos últimos anos fizeram muito pouca evidência dessa natureza conservadora – pelo contrário, antes fosse.

 

Há poucos dias, em conversa com dois empresários de PME ou startups, como prefiram, um de uma empresa de aquacultura e outro de uma empresa de plantas aromáticas, ouvi exactamente o mesmo relato. O périplo pela banca à procura de financiamento, as palmadas nas costas – bela ideia, bela ideia – e o cartão de visita para voltar ao banco uns anos depois, quando o balanço evidenciar que aquela bela ideia é mesmo um bom negócio. Ou seja, quando não precisar do dinheiro, ou pelo menos não precisar desse dinheiro como prova de vida. As duas empresas encontraram caminhos alternativos – uma com investimento que chegou de fora de Portugal, outra com investimento que saiu do bolso de outro empresário. É um final feliz, ou um princípio feliz, como se queira ver, mas em nenhuma destas histórias a banca se portou de forma diferente daquela a que nos habituou nestes já longos 30 anos.

 

Para fazer negócios passou a ser exigível prever o futuro, o que é particularmente curioso quando, retrospetivamente, verificamos que nunca se correram tantos riscos supostamente apoiados em análises de crédito à prova de bala e em ratings inquestionáveis. Para emprestar dinheiro às famílias – na habitação ou no consumo – não há muito que saber. Se tem casa e se tem ordenado, é executável, penhorável, descartável. E hoje, como antes, isso continua a ser uma decisão muito mais fácil do que contribuir para fazer crescer a economia real. A mesma economia que deverá criar riqueza real e postos de emprego reais.

 

Não consigo evitar lembrar-me, uma vez mais, da frase de Henry Ford: «Se as pessoas soubessem como funciona a banca, haveria uma revolução antes da manhã do dia seguinte.»

 

Mas como as verdadeiras revoluções demoram algum tempo, há que não perder de vista as alavancas da mudança. E uma delas é certamente perdermos o medo dos números. É esse o grande objectivo do novo projecto da Pordata que podemos ler no Público. “Na escola, as crianças aprendem a ler, a escrever e a contar. E o que sabemos hoje é que as estatísticas são o abecedário do futuro. Quem não estiver na posse desse abecedário fica com muitas limitações em termos da compreensão da sociedade em que vive.”, explica Maria João Valente Rosa, directora da Pordata.

 

E já que falamos em perceber os números, e no rescaldo de um debate em que as palavras-chave foram ‘prestações sociais não contributivas’, aqui fica um artigo da Renascença para nos ajudar a perceber do que estamos a falar.

publicado às 10:28

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